Vinho e Medicina: Uma Longa História

Vinho e Medicina: Uma Longa História

Niazi Rubez e a paixão pelo Vinho

Há alguns anos decidi escolher um hobby que pudesse me acompanhar pela vida à medida que envelhecesse. O vinho foi uma escolha óbvia, pois o paladar é dos sentidos o que menos se perde com o passar dos anos. À medida que fui tomando contato com o mundo do vinho o que era uma distração foi se transformando em paixão. Frequentei alguns cursos, passei a visitar feiras e fiz viagens com roteiros enológicos. A paixão me levou a encarar o assunto com mais seriedade e hoje sou pós-graduando no Centro Universitário do SENAC com enfoque em vinhos e outras bebidas.

Como único médico num grupo composto por chefes-de-cozinha, professores de gastronomia, advogado, arquiteto, dentre outras profissões fui estimulado a escrever minha monografia sobre vinho e medicina.

Vinho e Medicina

Nos últimos anos houve grande interesse nos efeitos do vinho sobre a saúde. Na década de 1980 a Organização Mundial da Saúde conduziu um grande estudo epidemiológico em escala mundial: o projeto MONICA (das iniciais em inglês para Monitoring of trends and determinands in Cardiovascular diseases) estudou as correlações entre hábitos dietéticos e doença cardiovascular. O estudo mostrou que os franceses tinham uma menor incidência de mortes causadas por doença aterosclerótica apesar de seguirem uma dieta rica em gorduras que comprovadamente está relacionada com maior incidência de aterosclerose. Ficando conhecido desde então como o “Paradoxo Francês”. Desde então surgiram inúmeros trabalhos mostrando os efeitos do vinho sobre não só o sistema cardiovascular mas sobre diversos órgãos e sistemas. Esse grande número de informações, muitas vezes um tanto quanto supervalorizada pela mídia e pela indústria nos dá a impressão que o interesse da medicina pelo vinho é recente. Ledo engano.

Um pouco sobre a História do Vinho

Não se pode precisar o local e a data em que o vinho foi descoberto. Caroços de uvas cultivadas foram encontrados em escavações arqueológicas na atual Geórgia e datam de 7000 a 5000 anos a.C.

As evidências históricas do uso do vinho na medicina são, entretanto, bem mais recentes. O primeiro registro escrito do seu uso é um tablete com escrita cuneiforme encontrado em escavações na antiga cidade Suméria de Nippur (Babilônia), datado de 2100 a.C.

Papiros com receitas médicas foram encontrados no Egito escritos entre 1900 e 1200 anos a.C. Nos papiros Hearst o vinho é citado em 12 de 260 prescrições. Era indicado para tratar asma, constipação, epilepsia, icterícia e depressão.

O vinho era usado na antiga Índia antes mesmo que na Grécia antiga. Muitas recomendações do Rig-Veda, as mais antigas escrituras sagradas do Hinduismo, são muito similares às contidas nas escritas egípcias. Uma prova das descobertas empíricas dos benefícios terapêuticos do vinho que ocorreram paralelamente em duas civilizações sem nenhum contato.

Vinho e Filosofia

Hipócrates ( ± 460 – 370 a.C.) separou a medicina da religião e fundou nossa profissão. Ele usou o vinho para tratar de ferimentos a caquexia, como diurético e anti-térmico. Vários filósofos gregos como Sócrates, Platão e Aristóteles escreveram sobre o vinho e seus efeitos. Eles usavam o vinho para estimular o raciocínio e a troca de ideias em longas conversas, os simpósios. Simpósio significa “beber junto”. Seu uso moderno de reunião de sábios e doutos deve-se a essas reuniões após o jantar quando eles se reclinavam em divãs e discutiam de tudo, sempre acompanhados por Baco.

Platão ressaltava que o vinho devia ser evitado por juízes e por aqueles que fossem procriar. Mas para os idosos recomendava : “…o vinho, que cura a ranhetice dos velhos, que nos permite recobrar nossa juventude e esquecer o desespero”.

Mas os gregos recomendavam moderação, e aqui vale citar Eubulo, que por volta de 375 a.C. aconselhava: “Três taças preparo para os comedidos: uma para a saúde, que esvaziam primeiro; a segunda para o amor e o prazer, a terceira para o sono. Depois de tomar esta última taça, os convidados prudentes vão para casa. A quarta taça já não é nossa, mas pertence à violência; a quinta ao tumulto; a sexta, à folia; a sétima, aos olhos roxos; a oitava, ao policial; a nona, à bílis; e a décima, à loucura”.

Seguindo o conselho de prudência de Eubulo me despeço esperando numa próxima oportunidade contar-lhes um pouco mais sobre essa bebida divina e sua história na Medicina.

Referências Bibliográficas:

  • JOHNSON, Hugh. A História do Vinho, Primeira Edição, São Paulo: Companhia das Letras, 2001
  • LUCIA, Salvatore P. A History of Wine as Therapy. Nova York: J.B. Lippincott Company, 1963.

* Médico Radiologista. Membro Titular do Colégio Brasileiro de Radiologia. Pós-Graduando em Gastronomia: Vinhos e Bebidas no Centro Universitário do SENAC – São Paulo. E-mail: [email protected]

Acesse o Blog BonVieVin e aprenda mais sobre vinhos

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Há alguns anos decidi escolher um hobby que pudesse me acompanhar pela vida à medida que envelhecesse. O vinho foi uma escolha óbvia, pois o paladar é dos sentidos o que menos se perde com o passar dos anos. À medida que fui tomando contato com o mundo do vinho o que era uma distração foi se transformando em paixão. Freqüentei alguns cursos, passei a visitar feiras e fiz viagens com roteiros enológicos. A paixão me levou a encarar o assunto com mais seriedade e hoje sou pós-graduando no Centro Universitário do SENAC com enfoque em vinhos e outras bebidas.

Como único médico num grupo composto por chefes-de-cozinha, professores de gastronomia, advogado, arquiteto, dentre outras profissões fui estimulado a escrever minha monografia sobre vinho e medicina.

Nos últimos anos houve grande interesse nos efeitos do vinho sobre a saúde. Na década de 1980 a Organização Mundial da Saúde conduziu um grande estudo epidemiológico em escala mundial: o projeto MONICA (das iniciais em inglês para Monitoring of trends and determinands in Cardiovascular disease) estudou as correlações entre hábitos dietéticos e doença cardiovascular. O estudo mostrou que os franceses tinham uma menor incidência de mortes causadas por doença aterosclerótica apesar de seguirem uma dieta rica em gorduras que comprovadamente está relacionada com maior incidência de aterosclerose. Ficando conhecido desde então como o “Paradoxo Francês”. Desde então surgiram inúmeros trabalhos mostrando os efeitos do vinho sobre não só o sistema cardiovascular mas sobre diversos órgãos e sistemas. Esse grande número de informações, muitas vezes um tanto quanto supervalorizada pela mídia e pela indústria nos dá a impressão que o interesse da medicina pelo vinho é recente. Ledo engano.

Não se pode precisar o local e a data em que o vinho foi descoberto. Caroços de uvas cultivadas foram encontrados em escavações arqueológicas na atual Geórgia e datam de 7000 a 5000 anos a.C.

As evidências históricas do uso do vinho na medicina são, entretanto, bem mais recentes. O primeiro registro escrito do seu uso é um tablete com escrita cuneiforme encontrado em escavações na antiga cidade Suméria de Nippur (Babilônia), datado de 2100 a.C.

Papiros com receitas médicas foram encontrados no Egito escritos entre 1900 e 1200 anos a.C. Nos papiros Hearst o vinho é citado em 12 de 260 prescrições. Era indicado para tratar asma, constipação, epilepsia, icterícia e depressão.

O vinho era usado na antiga Índia antes mesmo que na Grécia antiga. Muitas recomendações do Rig-Veda, as mais antigas escrituras sagradas do Hinduismo, são muito similares às contidas nas escritas egípcias. Uma prova das descobertas empíricas dos benefícios terapêuticos do vinho que ocorreram paralelamente em duas civilizações sem nenhum contato.

Hipócrates ( ± 460 – 370 a.C.) separou a medicina da religião e fundou nossa profissão. Ele usou o vinho para tratar de ferimentos a caquexia, como diurético e anti-térmico. Vários filósofos gregos como Sócrates, Platão e Aristóteles escreveram sobre o vinho e seus efeitos. Eles usavam o vinho para estimular o raciocínio e a troca de idéias em longas conversas, os simpósios. Simpósio significa “beber junto”. Seu uso moderno de reunião de sábios e doutos deve-se a essas reuniões após o jantar quando eles se reclinavam em divãs e discutiam de tudo, sempre acompanhados por Baco. Platão ressaltava que o vinho devia ser evitado por juízes e por aqueles que fossem procriar. Mas para os idosos recomendava : “…o vinho, que cura a ranhetice dos velhos, que nos permite recobrar nossa juventude e esquecer o desespero”. Mas os gregos recomendavam moderação, e aqui vale citar Eubulo, que por volta de 375 a.C. aconselhava: “Três taças preparo para os comedidos: uma para a saúde, que esvaziam primeiro; a segunda para o amor e o prazer, a terceira para o sono. Depois de tomar esta última taça, os convidados prudentes vão para casa. A quarta taça já não é nossa, mas pertence à violência; a quinta ao tumulto; a sexta, à folia; a sétima, aos olhos roxos; a oitava, ao policial; a nona, à bílis; e a décima, à loucura”.

Seguindo o conselho de prudência de Eubulo me despeço esperando numa próxima oportunidade contar-lhes um pouco mais sobre essa bebida divina e sua história na Medicina.

Referências Bibliográficas:

  • JOHNSON, Hugh. A História do Vinho, Primeira Edição, São Paulo: Companhia das Letras, 2001
  • LUCIA, Salvatore P. A History of Wine as Therapy. Nova York: J.B. Lippincott Company, 1963.

* Médico Radiologista. Membro Titular do Colégio Brasileiro de Radiologia. Pós-Graduando em Gastronomia: Vinhos e Bebidas no Centro Universitário do SENAC – São Paulo. E-mail: [email protected]

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